Bancos europeus que praticam o colonialismo climático

Conheça os bancos europeus que praticam colonialismo climático na Amazônia

Imagem: Melissa Teixeira – 350.org
Imagem: Melissa Teixeira – 350.org

Nos escritórios de alguns dos maiores bancos europeus, em Genebra, Paris ou Utrecht, deve ser difícil encontrar funcionários vestidos com proteções de couro nas pernas ou executivas com mantos bordados cobrindo o cabelo e a boca.

Porém, se as roupas dos colonizadores espanhóis no século XVII já não fazem sucesso nos corredores das instituições financeiras europeias, a atitude de ganhar dinheiro explorando predatoriamente os recursos da América Latina e prejudicando os Povos Indígenas da região continua na moda em pleno 2021.

Isso é o que a 350.org concluiu ao ler o relatório “Bancos europeus financiando o comércio do controverso petróleo da Amazônia para os Estados Unidos“, divulgado em agosto de 2020 pelas ONGs Amazon Watch e Stand.Earth.

A pesquisa revela que seis instituições financeiras europeias são responsáveis por 85% do crédito oferecido pelos bancos ao comércio do petróleo extraído de uma das áreas mais sensíveis da Amazônia equatoriana, a região das Cabeceiras Sagradas.

O documento aponta para a hipocrisia dessas empresas, que anunciam compromissos ambientais e sociais na Europa, mas lucram com práticas irresponsáveis no Equador.

Como os bancos praticam o colonialismo climático?

Basicamente, eles pregam respeito ao clima em anúncios feitos na Europa, mas agravam a crise climática global e a vulnerabilidade dos Povos Indígenas ao viabilizar extração de combustíveis fósseis na América Latina. Fazem na terra dos outros aquilo que dizem não fazer na sua, levam a maior parte dos ganhos e ainda deixam os impactos sociais e ambientais na região explorada. Não é uma dinâmica parecida com a dos antigos colonizadores?

Essa padrão duplo foi detalhado pela Amazon Watch e pela Stand.Earth em seu relatório:

  • Pelo menos 19 bancos financiam o comércio do petróleo extraído das Cabeceiras Sagradas do Amazonas.
  • Desses, os seis principais financiadores, todos europeus, respondem por 85% do crédito para esse tipo de comércio. São eles, por ordem participação nos financiamentos:
    – ING Belgium (filial em Genebra)
    – Credit Suisse (filial em Genebra)
    – Natixis (filial em Paris)
    – BNP Paribas Suisse (filiais em Paris e Genebra)
    – UBS (filial em Genebra)
    – Rabobank (filial em Utrecht, na Holanda)
  • Considerando-se o comércio de petróleo apenas entre empresas que atuam no Equador e refinarias dos Estados Unidos, entre janeiro de 2009 e maio de 2020, o crédito oferecido por todos os bancos envolvidos viabilizou a venda de 155 milhões de barris de petróleo. O volume corresponde a um faturamento de 10 bilhões de dólares. 

  • Qual é o problema de financiar esse tipo de comércio?

    Os impactos ambientais e sociais desse comércio são terríveis.

    • Para o clima

    Só o petróleo exportado para os Estados Unidos continha cerca de 66 milhões de toneladas métricas de CO2, o que equivale à emissão anual produzida por 17 usinas termelétricas a carvão. Os bancos estão lucrando com a piora da emergência climática, que afeta a todos no planeta, mas que impacta desproporcionalmente as famílias mais pobres e as comunidades vulneráveis.

    • Para os Povos Indígenas

    A região conhecida como Cabeceiras Sagradas, de onde o petróleo foi extraído, estende-se por quase 30 milhões de hectares da Floresta Amazônica do Equador e do Peru e é o lar de cerca de meio milhão de indígenas, de 20 etnias diferentes. Muitas dessas comunidades sofrem há décadas com vazamentos de petróleo e com as intimidações que recaem sobre os líderes que se manifestam contra a extração petrolífera. Um exemplo recente:

    Em abril de 2020, enquanto o povo do Equador vivia momentos difíceis por causa da pandemia de Covid-19, os moradores da região das Cabeceiras Sagradas tiveram que lidar também com o pior vazamento de petróleo na região em 15 anos. A contaminação alcançou centenas de quilômetros de dois dos principais rios da região e prejudicou o abastecimento de água e de alimentos, além da obtenção de renda das comunidades indígenas. Cerca de 120 mil pessoas foram afetadas, das quais pelo menos 27 mil são indígenas. Moradores da região ainda relataram problemas de saúde, inclusive doenças de pele resultantes do contato com a água do rio, que é a única fonte de água para banho para diversas famílias. O vazamento ainda atrapalhou a prevenção à Covid-19, já que uma da principais medidas de cuidado para evitar o vírus é lavar as mãos com frequência.

    • Para a biodiversidade

    A região de onde o petróleo é extraído abriga uma das maiores biodiversidades terrestres do planeta e algumas das principais nascentes do Rio Amazonas, que, como bem sabem os brasileiros, marca uma área gigantesca do território do Brasil. Um vazamento grave nessa área pode prejudicar de forma imprevisível o equilíbrio da vida na floresta e nos rios.

    O desrespeito do setor petrolífero aos indígenas do Equador vem de décadas e já havia sido registrado, em fevereiro de 2020, no relatório Violações aos direitos humanos pelas empresas de combustíveis fósseis, da 350.org.

    Os bancos citados podem fazer algo para evitar as práticas colonialistas?

    Sim, o próprio relatório da Amazon Watch e da Stand.Earth recomenda algumas medidas.* Promover a transparência em qualquer financiamento ao comércio de produtos extrativos.

    • – Garantir que todos os financiamentos a projetos ou a transações comerciais só sejam liberados com a comprovação de práticas que permitam o consentimento livre, prévio e informado dos Povos Indígenas, como prevê a declaração 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
    • – Deixar de financiar a extração e o comércio de petróleo da Amazônia, a não ser que as medidas de garantia aos direitos dos indígenas sejam respeitadas.

    Aliás, embora o relatório não diga isso, nós perguntamos: por que não parar de financiar o petróleo em qualquer lugar e sob qualquer condição, já que os combustíveis fósseis, mesmo se extraídos sem prejudicar diretamente os Povos Indígenas, vão prejudicá-los indiretamente, assim como a todos nós, pelo agravamento da crise climática?

    Bancos que se dizem sustentáveis já deveriam ter parado de lucrar com o desastre ambiental e social que nos aguarda, se não pararmos já de emitir CO2. É isso que vai diferenciá-los dos colonizadores de quatro séculos atrás.

    Fonte: Peri Dias – Gerente de Comunicações da 350.org

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